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Cobertura No Ar 2017: Renovado, o Molotov fez sua melhor edição


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O festival No Ar Coquetel Molotov iniciou uma nova fase nesta 14ª edição, mudando-se para o Caxangá Golf Club, Zona Oeste do Recife, bem mais central e acessível e com mais espaço que a edição passada. Foram quatro palcos (Som na Rural, Sonic, Aeso e Velvet), em uma programação que começou às 13h e terminou lá pelas 5h da madrugada. Teve ainda diversos espaços que promoviam experiências de todo tipo, de oficinas de sustentabilidade, oficinas de customização, performances artísticas de tecido, feira cultural, food parks e até uma convenção de tatuagem!

Quando Linn da Quebrada iniciou seu show no palco principal ficava claro que o festival tinha atingido seu objetivo de ser hoje uma das principais vitrines da diversidade musical que se tornou o pop brasileiro. Em constante mutação, a cena musical hoje acompanha mudanças de mentalidade da sociedade e tornou-se mais um espaço de embate sobre assuntos urgentes como racismo, feminismo, gênero e sexualidade. Poucos eventos conseguem traduzir essa inquietação na música como o No Ar.

Essa transformação foi acumulando-se ao longo dos anos, sendo o No Ar o festival que mais se arriscou no sentido de pautar diferentes atrações, apostar em ritmos emergentes (além do Coquetel, o Rec-Beat segue com a mesma diretriz). Não é pouca coisa. Esse diálogo entre um público interessado em se reconhecer no palco, ouvir novidades fora da caixinha, curtir um dia de experiência libertária, sem rótulos, e uma programação diversificada têm garantido a relevância do No Ar Coquetel Molotov.

Mas essa edição teve um trunfo a mais: a estrutura teve um salto positivo enorme em relação à última edição na Coudelaria Souza Leão, na Várzea. Naquele ano, a enorme quantidade de pessoas e a infra-estrutura que necessitava de vans para deslocar a plateia, causou transtornos. Desta vez, não. O Caxangá é enorme, com muito espaço aberto, palcos com boa estrutura e bem menos filas. Cada palco tinha mais de uma barraca de venda de bebidas e deu para ver todos os shows sem aperto.

A ideia de disponibilizar a venda volante de fichas de consumo deu muito certo. Ainda há muito espaço potencial para ser utilizado no Caxangá, o que sinaliza que o festival pode crescer nos anos seguintes que não afetará o conforto do público.

O corpo é político (e o palco também)

O show de Linn da Quebrada, fazendo sua estreia no Recife, foi histórico. Apresentado pela ativista transexual Maria Clara Araújo, a MC fez uma apresentação poderosa, com hits como “Bomba Pra Caralho”, “Enviadescer” e “Submissa do 7º Dia”, todos presentes em seu primeiro álbum, Pajubá. “Estamos vivas! Seguimos resistindo! Estamos vivas”, disse, representando todas as mulheres e homens trans. Ela trouxe ao palco a cantora brega Nega do Babado onde cantou o “hino nacional de Pernambuco”, o hit absoluto “Milk Shake” (aquele do refrão “eu gosto assim / eu gosto quando você sobe, desce, fica em cima de mim”). Essa mistura de rap, funk e brega é uma amostra clara da diversidade do No Ar hoje. Com sua apresentação, Linn mostrou que seu corpo é político – bem como o palco.

Foi um período longo desde aquele show do Teenage Fanclub há 14 anos, quando o No Ar começava a se firmar e acabaria sendo reconhecido como um reduto indie e alternativo. Hoje, com a benção do público, o festival se transforma em referência de diversidade e espelho dessa cena musical atual, polifônica, experimental, política e cada vez mais interessada em diálogos.

O palco principal trouxe ainda Rincon Sapiência, autor de um dos mais importantes álbuns de rap deste ano, Galanga Livre. Apostando em uma confluência de estéticas que vai do afropunk ao samba, passando pelo funk, rock e até ciranda, Rincon fez um dos melhores shows da noite. O público cantou de cor todos os seus hits, entre eles “Ponta de Lança”, “A Coisa Tá Preta” e “Ostentação à Pobreza”, faixas que são ao mesmo tempo resistência e celebração do que significa ser negro no Brasil hoje. São rimas que protestam contra o racismo, pobreza, exploração do trabalhador, mas também enaltece o amor, chama pra dançar. “Vou botar no meu texto que pretas e pretos estão se amando”, diz o MC. Ele chamou ao palco Lia de Itamaracá para a música que fizeram em conjunto, “Moça Namoradeira”. “Vamos aplaudir a lenda”, conclamou o rapper sobre a cirandeira, um dos nomes mais icônicos da música pernambucana.

O palco Velvet foi abaixo com o show do ÀTTØØXXÁ, já quase com o dia amanhecendo. Assim como fez Linn e Rincon, a banda também homenageou Pernambuco com músicas de Chico Science e a Nação Zumbi. A apresentação do grupo tem um misto de virtuosismo técnico com catarse de batidas, tudo feito para o público se soltar, ir até o chão, se acabar.

Outros destaques do festival foram a banda espanhola Hinds, que faz um som indie e incrivelmente contagiante e o DIIV, dos EUA, que trouxe um tom de rock meio pós-punk. A banda segurou um show com personalidade ainda que na hora deles tenha caído uma chuva torrencial. O palco ainda teve o show de Arnaldo Baptista, abrindo, com muita gente ainda chegando ao Caxangá. E teve, claro, a NoPorn, uma das atrações mais pedidas este ano e que tem um público grande aqui no Recife.

Para quem acompanhou todos os coqueteis, tipo eu, este talvez seja a melhor edição de todas. Bons shows, lugar massa, boa estrutura, e o mais importante, atrações e públicos interessados em se verem como seres políticos, que se divertem, conversam, se expressam livremente. Uma proposta de festival como essa, hoje, não deixa de ser uma resistência.

Fonte: O Grito!

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