Clipagens

Máquinas com alma de artista



Tecnologia em estudo no Brasil e na França tenta desvendar o estilo de grandes músicos para reproduzi-lo através de inteligência artificial Em breve, a música não será somente feita em computadores, mas criada e executada por eles. Com a mesma técnica e, possivelmente, com aquele molho que aparentemente só humanos conseguem dar ao interpretarem uma canção. As pesquisas para entender como funciona a execução musical e as formas para fazer com que inteligências artificiais possam executar uma partitura com a mesma qualidade de um humano foram temas centrais da palestra-show sobre novas tecnologias para a música, realizada na última quinta-feira, na sede do Porto Digital, pelo Centro de Informática (CIn) da UFPE. Parte da programação do Ano da França no Brasil, o evento trouxe cientistas daquele país, que se juntaram a especialistas do polo local para demonstrar os avanços da computação musical. “Esse campo da ciência nem é totalmente científico nem totalmente musical. É um misto muito interessante dos dois”, conta um dos convidados, o professor do Laboratório de Ciência da Informação de Paris 6 (LIP6), Jean-Pierre Briot, que há 17 anos pesquisa o assunto em parceria com o CIn. O encontro foi ciceroneado pelo professor Geber Ramalho, mais conhecido pela sua atuação na área de jogos, mas que há muito tempo faz a interface entre bits e acordes. “Na verdade, comecei a atuar na área com computação musical”, destaca. Atualmente, Ramalho conduz uma pesquisa que tenta desvendar os mistérios por trás do peculiar estilo do ícone da bossa nova, João Gilberto. “É uma espécie de radiografia da música, para mostrar como é difícil fazer um computador tocar como um humano”, revela. Ele conta que, analisando gravações de violonistas tocando padrões de violão de João Gilberto, foi possível identificar microvariações de tempo, intensidade e volume entre os diferentes intérpretes. Possivelmente, a chave para o que músicos de carne e osso chamam de estilo. “Hoje um computador é capaz de tocar uma partitura sem problemas. Mas a música é dura, perfeita. Descobrimos que são essas imperfeições intencionais dos músicos que dão o molho. E na medida em que houver dados suficientes, é possível criar softwares que não só toquem o ritmo, mas confiram um ar humano à execução”, conta Ramalho. Do outro lado do Atlântico, outro acadêmico tenta identificar a natureza dos mestres do improviso musical e, através de softwares, dar ao homem comum a possibilidade de se tornar um virtuoso com apenas alguns cliques. O pesquisador francês François Pachet, que opera no laboratório de ciência da computação da multinacional Sony em Paris, desenvolveu um software que captura acordes tocados aleatoriamente em um instrumento qualquer, conceito que o pesquisador compara ao ato de rabiscar em um papel. Controlando esses padrões inicialmente aleatórios, é possível se tornar um mestre dos solos sem ter que estudar uma vida inteira para isso. “Virtuosismo é como um jogo combinatório, em que o músico tem que achar um caminho coerente entre as várias possibilidades. É um rabisco musical controlado. Assim, uma máquina pode ser um virtuose. A questão é o controle”, afirma Pachet. Seu sistema usa um software que captura o rabisco musical do usuário e, através do joystick do videogame Wii, permite que ele controle o improviso modificando a velocidade, intensidade e tempo da gravação. “O fato é que pouca gente pode ser um virtuoso. É algo que leva uma vida inteira de estudo e dedicação. Mas talvez as pessoas possam, através da tecnologia, ter essa experiência de tocar como um dos mestres”, afirma. Pachet diz que está negociando com a própria Sony a possibilidade de transformar sua pesquisa em um jogo para o console Playstation 3. (J.W.)

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